quarta-feira, 10 de junho de 2009

APROFUNDANDO O TEMA PETROBRAS X IMPRENSA

Já comentei este assunto no blog, mas o aprofundei no site Jornalistas & Cia (www.megabrasil.com.br). O post reproduz o que escrevi lá


Em meu último comentário neste espaço, eu escrevi que no 12° Congresso de Comunicação Corporativa, o premiado como Personalidade da Comunicação 2009, Nelson Sirotsky, presidente do grupo RBS e o governador José Serra, que lhe entregou o troféu, defenderam a urgente necessidade de regulamentar o direito de resposta, em função da extinção da malfadada lei de imprensa da ditadura. E acrescentei que o direito de resposta é um elemento essencial para um bom e justo relacionamento entre a imprensa livre, a cidadania e as instituições.

Pois bem, uma iniciativa da Petrobras abriu uma incendiária discussão sobre como as empresas e instituições podem fazer chegar a sua versão dos fatos ao público, independentemente dos jornais lhes concederem o direito de resposta integral, parcial, enfim, do jeito que for.No meu blog Serrano & Cia. (http://www.serranoecia.blogspot.com/) postei uma reflexão sobre essa questão, na última sexta-feira. Com base naquele post e novas informações, analisarei a questão com mais profundidade neste texto.

Os jornais foram pegos de surpresa com a iniciativa da Petrobras de criar o blog “Fatos e Dados” para comunicação direta com o público para tratar das questões que serão discutidas na CPI.A estatal de petróleo publica as perguntas que recebe dos jornais e as respostas que encaminha à eles.

Algumas vezes, posta um fac-símile da reportagem que foi publicada no jornal e as perguntas que recebeu e as respostas que deu para essa reportagem. O leitor pode comparar a íntegra da resposta e o que jornal publicou dela.

O Estado de S.Paulo, Folha e Globo questionaram a Petrobras sobre as razões que a levaram a criar o blog. Ela respondeu que assim dará maior transparência às suas respostas em relação às questões em torno da CPI.Os jornais se queixam por duas razões. Se a Petrobras postar as perguntas e respostas antes da publicação da reportagem, os concorrentes saberão o que eles estão investigando. Isso impedirá "furos" de reportagem. E os leitores terão como avaliar como o jornal tratou a informação fornecida pela empresa.

Do ponto de vista deles, ou seja, da preservação do furo e do trato editorial da informação, os jornais tem razão de se incomodar.

Do ponto de vista da Petrobras, ela está apenas lançando mão das possibilidades de comunicação direta com o público propiciada pela Internet. Tira dos jornais o papel de intermediários exclusivos daquela informação. O blog certamente será mantido depois da CPI, pois é um instrumento útil para as empresas e para todos que quiserem seguir o seu exemplo.

Foi uma iniciativa inovadora que dá um drible no domínio da imprensa no trato da informação. De maneira nenhuma prejudica o trabalho investigativo que a imprensa deve fazer e é muito importante e bem vindo. Mas dá novo espaço para as empresas e instituições lidarem com as reportagens sobre elas.

O “Fatos e Dados” da Petrobras provocou uma enorme discussão na blogosfera.

Jornalistas questionaram a Petrobras, acusando-a de estar violando a ética do relacionamento entre os repórteres e os alvos das reportagens, pela qual as perguntas a eles encaminhadas só interessam às duas partes. Ou só devem ser divulgadas depois que a matéria for publicada.

A Associação Nacional dos Jornais protestou, em nota assinada pelo seu vice-presidente e responsável pelo Comitê de Liberdade de Expressão Júlio César Mesquita: “A Associação Nacional de Jornais (ANJ) manifesta seu repúdio pela atitude antiética e esquiva com que a Petrobras vem tratando os questionamentos que lhe são dirigidos pelos jornais brasileiros, em particular por O Globo, Folha de S.Paulo e O Estado de S.Paulo, que nas últimas semanas publicaram reportagens sobre evidências de irregularidades e de favorecimento político em contratos assinados pela estatal e suas controladas.Numa canhestra tentativa de intimidar jornais e jornalistas, a empresa criou um blog no qual divulga as perguntas enviadas à sua assessoria de imprensa pelos jornalistas antes mesmo de publicadas as matérias às quais se referem, numa inaceitável quebra da confidencialidade que deve orientar a relação entre jornalistas e suas fontes.Como se não bastasse essa prática contrária aos princípios universais de liberdade de imprensa, os e-mails de resposta da assessoria incluem ameaças de processo no caso de suas informações não receberem um “tratamento adequado”.Tal advertência intimidatória, mais que um desrespeito aos profissionais de imprensa, configura uma violação do direito da sociedade a ser livremente informada, pois evidencia uma política de comunicação que visa a tutelar a opinião pública, negando-se ao democrático escrutínio de seus atos”.

O presidente da Petrobras, Sérgio Gabrielli, segundo matéria publicada pela Folha UOL, defendeu a criação do blog feito pela estatal e negou que haja uma tentativa de intimidação da imprensa. Em entrevista ao programa “Roda Viva”, da TV Cultura, disse que o blog “Fatos e Dados” busca dar transparência às informações, e que os jornalistas terão que se adaptar à divulgação dos pedidos relativos às pautas.“Estamos apostando num instrumento possibilitado pela internet, criado num momento de intensa exposição sobre temas da Petrobras, com várias interpretações diferentes, com várias conotações distintas, matérias insinuadoras que precisam ser publicadas na íntegra”, afirmou. Gabrielli minimizou queixas dos jornalistas de que a Petrobras estaria vazando informações, ao publicar os pedidos antes de as reportagem serem publicadas. Para o executivo, a Petrobras é a dona das informações, e tem o direito de definir suas divulgações.Ele defendeu ainda que outras empresas passem a adotar procedimento semelhante. “Nós vamos revolucionar o jornalismo brasileiro”, disse.

O blog “Biscoito Fino e a Massa”, de Idelber Avelar, diz que a iniciativa da Petrobras tem um precedente. Avelar relata que, durante recente embate entre o jornal O Estado de Minas e a Universidade Federal de Minas Gerais, a instituição pediu direito de resposta várias vezes, inclusive enviando o seu Procurador pessoalmente ao jornal e o direito foi sempre negado. A UFMG, de acordo com Avelar, passou a responder pela própria internet e o Estado de Minas foi até pedir direito de resposta no site da universidade.

Embates à parte, o fato é que o jornalismo está navegando em novas águas e iniciativas como a da Petrobras e da UFMG estão dando um novo direcionamento à questão do direito de resposta. Não cabe à Petrobras “revolucionar o jornalismo brasileiro”, mas sua atitude é válida. E cabe aos jornais se adaptarem com criatividade a essa nova realidade.

As empresas e instituições devem utilizar esse recurso com parcimônia. Se têm um bom relacionamento com um veículo ou jornalistas não devem lançar mão dele. Ressalvo que bom relacionamento significa que as matérias publicadas contém informações corretas, embora não necessariamente simpáticas às empresas. Não vale a pena, sob o ponto de vista de imagem, tensionar um relacionamento correto. Mas se o relacionamento for conflituoso e distorcido é um recurso legítimo publicar as respostas aos questionamentos na íntegra na blogosfera. Mas também é preciso que a empresa tenha credibilidade junto ao público.

Jornais e jornalistas, por sua vez, devem usar a criatividade. Se uma empresa adotar o hábito de colocar na internet as perguntas que lhe são dirigidas, antes da publicação da matéria, sugiro uma atitude preventiva. Publiquem na edição do dia a seguinte informação: “Estamos enviando à empresa tal as seguintes perguntas, para esclarecer a questão tal” e enviem, nesse dia, as perguntas. Dessa forma, fica caracterizado que o jornal foi o primeiro a ir atrás do assunto e seu furo estará garantido.

Novos tempos, novas mídias, novas técnicas exigem criatividade e a construção de novas éticas. O importante é que a opinião pública seja bem e corretamente informada. É um belo desafio para jornais, jornalistas, empresas e instituições em geral.

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