O presidente Barack Obama é considerado o “Rei da Comunicação” por ter usado à exaustão as ferramentas de internet para vencer a eleição do ano passado. Há duas semanas, postei aqui um comentário mostrando que a revista New York publicou uma reportagem de capa com o título "The Selling, and Selling, and Selling of the President". A matéria aborda a multipla e intensa presença de mensagens do presidente Obama à sociedade norte-americana, via mídia, especialmente via a nova mídia.
Anteriormente, publiquei outro post em que lembrava que o importante na comunicação do serviço público (aliás, em todo tipo de comunicação) é o conteúdo, qualquer que seja a ferramenta utilizada, seja da velha ou da nova mídias.
Por que estou me referindo a estes antigos posts? Porque Obama está tendo enormes dificuldades para fazer avançar a sua proposta de reforma do sistema de saúde nos EUA. Está sentindo na pele uma verdade que ele próprio já enunciou: que é mais fácil convencer as pessoas da justeza de suas idéias em uma eleição do que quando se está no governo.
O fato é há 45 milhões de pessoas nos EUA que não tem qualquer cobertura de seguro médico. Há lá dois sistemas públicos, o Medicare para atender idosos acima de 65 anos e deficientes e o Medicaid voltado para os mais pobres. Os ricos pagam seus planos. Mas a classe média depende dos planos oferecidos pelas empresas ou instituições em que trabalham, quando elas os oferecem. Não tem recursos para pagar os planos que são muito caros. É nessa faixa da sociedade que se encontram os 45 milhões de não cobertos, para os quais a proposta de Obama seria, inicialmente, criar algum tipo de seguro público. Além disso, os serviços médicos são muito caros nos EUA, o que faz com que os gastos públicos com os planos Medicare e Medicaid já sejam altíssimos.
Para ampliar a cobertura para a classe média, Obama também pretende controlar e baixar esses gastos. O pacote que propôs inicialmente para aprovação do Congresso, previa que para bancar o novo plano o governo gastaria US$ 1 trilhão em dez anos e criaria, para financiá-lo, um novo imposto para quem ganha US$ 250 mil ou mais por ano.
O debate da proposta virou uma Torre de Babel de discursos prós e contras que fez entrar muita areia na discussão, que não vai para frente para trás. Os republicanos lançaram mão de todas as crenças liberais dos americanos para berrar que o plano é uma invasão indevida da liberdade individual dos cidadãos. Mais: que introduz o socialismo nos EUA. Sarah Palin, a ex-candidata a vice-presidente pelo Partido Republicano, inventou que o plano embute uma “Comissão da Morte”. Trata-se da idéia de criar um espaço para a discussão sobre até quando se deve prolongar a vida de pessoas já condenadas, se é eficiente ou não insistir em tratamentos que não vão trazê-las de volta à vida normal. Um assunto delicado, sem dúvida, mas longe, muito longe, de ser uma instância de decisão sobre a vida ou morte das pessoas. Mas é um detalhe que foi amplificado para erguer barreiras à aprovação do plano.
Some-se a tudo isso o lobby das seguradoras e dá para imaginar o tamanho do dique que está se construindo como anteparo à evolução da discussão. Apesar de o Congresso ter uma maioria democrata, vários dos membros do partido se sensibilizam com essas críticas, o que não ajuda a tramitação das propostas do presidente norte-americano.
Trabalha contra Obama, neste momento, ainda, o fato de a economia americana não ter se recuperado da crise do ano passado. Deixou de piorar, o que já é muita coisa, mas ainda não está navegando em números positivos. Embora Obama tenha herdado essa crise e a esteja combatendo com todas as suas forças, essa moldura é usada para enfraquecer suas propostas para a reforma do sistema de saúde. Um dos argumentos é que não se pode acrescentar mais despesas a um erário que já está sobrecarregado com os planos de financiamento à indústria e aos bancos para recuperar a economia.
Abordei longamente este tema porque o considero exemplar das dificuldades com que se pode deparar ao propor políticas públicas altamente meritórias para sociedades complexas como a norte-americana ou qualquer outra. É um caso claríssimo de um governo que tem domínio total das mais modernas e contemporâneas ferramentas de comunicação, mas esbarra nas idiossincrasias políticas e ideológicas da sociedade e acaba perdendo o pulso de suas propostas.
Obs: O gráfico abaixo, importado do ex-blog do César Maia, mostra como a intenção de voto em Obama cresceu depois da derrocada do banco Lehman Brothers, que marca o início do período mais sério da crise financeira nos EUA. A época da crise do banco está marcada pelos pontos verdes e a intenção de voto em Obama é assinalada pela linha vermelha. Ou seja, muitos eleitores migraram para Obama por causa da crise e estariam descontentes atualmente porque ela ainda não foi resolvida. Esses eleitores certamente engrossam os exército de opositores à proposta de Obama para a reforma do sistema de saúde dos EUA.

Obama esbarrou onde muitos profissionais de comunicação esbarram: na convicção de que o ser humano é racional. É nessas horas, quando defrontados com argumentos racionais, que se percebe a força das emoções, das convicções arraigadas e do medo. E é nessa onda que surfa o debate sobre o sistema de saúde nos EUA.
ResponderExcluirÉ a realidade é dura, mas se ele disse que pode, vai achar um caminho... água mole em pedra dura tanto bate até que fura....ainda acredito - ou quero acreditar - que ele vai conseguir....
ResponderExcluirSe tivessemos um político que metade da vontade dele para lutar pelas coisas que considera necessárias, já seria um bom progresso por aqui.... ao invés do circo do nosso Senado!
é .....
ResponderExcluiraqui entra a realidade dura do "falar é fácil, difícil é fazer"