FHC SOBRE O REAL: "ERA VISÍVEL O CANSAÇO COM A INFLAÇÃO"

"O Plano Real foi um dos momentos de fortalecimento e de consolidação da nação. A avaliação é do presidente Fernando Henrique Cardoso para quem o real é fruto da democracia, porque foi um processo de envolvimento de toda a sociedade e de discussão com o Congresso.

Ele lembrou que era visível naquele momento o cansaço da sociedade com a inflação. Oito planos haviam sido tentados, observou FHC. Para ele, teria sido praticamente impossível adotar um mecanismo complexo como a URV (Unidade Real de Valor), que deu origem à nova moeda, se não fosse a compreensão da população e da mídia sobre o processo. FHC destacou também a decisão do presidente à época, Itamar Franco, de transferi-lo do Ministério das Relações Exteriores para o da Fazenda, em substituição a Elizeu Rezende .

Mas o Real, em sua avaliação, não foi suficiente para mudar o país. Por isso, disse ser necessária a criação de um clima propício para se eliminar as mazelas sociais e se levar adiante as transformações necessárias, com o mesmo espírito de luta com que foi feito o Plano Real. Para ele, é necessário ainda a construção de instituições perenes e uma reforma do comportamento, que se oriente por valores como a frugalidade.

O ex-presidente disse ser preciso ainda repensar o tipo de crescimento se quer para o país, o que implica, na sua opinião, ter em conta a questão ambiental. Ele defendeu também uma revolução educacional e mais investimentos em infraestrutura, muito mais do que propõe o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC)."

A fala de FHC ocorreu na sessão de comemoração dos 15 anos do Plano Real, promividas pelo PMDB, ontem, no Senado Federal. As informações acima foram divulgadas pela Agência Senado.

Seguem algumas observações minhas:

Em programa de entrevistas de Willian Waack. no domingo passado, o economista Luiz Carlos Mendonça de Barros destacou que o "pulo do gato" politico do Plano Real foi FHC ter percebido que a população ansiava por algo que destruisse a inflação e ter dado carta branca à sua equipe para produzir a bomba que conseguisse esse objetivo. FHC confirmou isso em sua fala no Senado ao dizer que "era visível naquele momento o cansaço da sociedade com a inflação".

FHC citou a iniciativa do então presidente Itamar Franco de nomeá-lo Ministro da Fazenda em lugar de Elizeu Rezende. É bom lembrar que não foi uma substituição pensada, fruto de uma decisão política de Itamar. Foi casual. A Folha de S.Paulo noticiou que Elizeu Rezende havia viajado para Nova York ao lado de um lobista de uma empreiteira e que esta havia pago a sua estadia na cidade americana. Itamar teve que demiti-lo.

FHC havia sido um dos articuladores da aceitação tranquila de Itamar na presidência com o impeachment do Collor. E apesar de estar no Ministério das Relações Exteriores era um dos principais articuladores políticos do governo. Como, naquele momento, a inflação já havia se tornado um problema político, mais do que econômico, pois a instabilidade fragilizava as instituições e paralisava o desenvolvimento do país, sua nomeação para a Fazenda surgiu naturalmente.

A URV foi o mecanismo criado para se evitar o congelamento, que não dera certo em planos anteriores. Seu objetivo era fazer com que, no momento em que a nova moeda fosse criada, os preços estivessem alinhados e ficassem imobilizados o maior tempo possível no mesmo patamar. Assim o processo inflacionário seria contido e controlado.

Assisti à negociação da transformação dos primeiros preços da economia em URVs. Foram os da indústria farmacêutica. Foram negociações duras entre as empresas e o Ministério da Fazenda. Os preços foram todos alinhados para cima, mas em um patamar de 70% do valor que a indústria desejava. Os dois lados cederam. Essa negociação se repetiu em todos os setores da economia.

Em resumo, foi provocada uma inflação para o alinhamento dos preços, que passou desapercebida para a população em razão da camuflagem da URV.

A partir dali, começou-se tudo do zero. E deu certo, muito certo.