quarta-feira, 11 de fevereiro de 2009

O MERCADO FINANCEIRO É MÍOPE

O míope só enxerga de perto, não vê longe, não tem perspectiva.

O mercado financeiro americano comportou-se como míope na reação e nas críticas ao pacote apresentado pelo Secretário do Tesouro , Timothy Geithner, para reativar os mercados de crédito e recuperar o insolvente sistema financeiro do país. A Bolsa caiu e choveram críticas à falta de "clareza" das medidas anunciadas pelo Secretário.

O mercado estava esperando o anúncio de medidas que o tirassem rapidamente do buraco em que se meteu, pouco se preocupando com as questões políticas e institucionais que envolvem uma iniciativa desse tipo, especialmente diante do tamanho do imbroglio.

Pouco se importando com o fato de que o desfio é recuperar a economia americana como um todo, não só o setor financeiro, que é fundamental e estratégico, mas não é tudo.

Pouco se importando com a boa ou má utilização de dinheiro público, dos contribuintes, desde que seja para salvá-lo.

A mídia mundial concentrou o noticiário nas críticas ao mercado financeiro, passando a impressão de que o governo Obama malograra irreversívelmente. Até o conceituado Martin Wolf, do Financial Times, uma espécie de oráculo do jornalismo financeiro, abriu o seu artigo surpreendentemente: "Será que a presidência de Barack Obama já fracassou?". E prosseguiu dizendo que o presidente americano precisa agir com "foco e ferocidade" em suma, liquidando todos os bancos problemáticos. Wolf acha que Obama está sendo muito suave.

Há algum tempo, outro oráculo do mundo financeiro, o Prêmio Nobel Paul Krugman também vem insistindo que o governo americano deve gastar muito mais do que está se propondo para superar a crise. Bom, Obama já se dispõs a utilizar US$ 2,8 trilhões, pouco menos de 30% do PIB do país, o que é muito. "Há uma interpretação de que o pacote não é tão ruim, mas não está claro se essa é a interpretação correta", disse Krugman.

Colaborou para a sensação de fracasso, de derrota política, a dificuldade de Obama para aprovar o seu pacote de R$ 838 milhões no Senado, em função da renhida resistência dos Republicamos em avalizá-lo. O presidente americano vinha tentando uma estratégia política bi-partidária para a superação da crise, crente que as necessidades da população, diante da grave situação econômica, fariam os Republicanos fechar com as suas propostas. Mas estes preferiram se comportar só como oposicionistas, ancorando-se publicamente nas suas crenças liberais, contrárias ao uso de dinheiro público na economia. No íntimo, só queriam mesmo atrapalhar Obama, pouco se importando com a situação até mesmo de seus eleitores.

O fato concreto é que a situação é muito complexa, pois as soluções devem ser aprovadas pelo Congresso, onde o governo tem maioria na Câmara dos Deputados, mas de apenas um Democrata no Senado, o que possibilita aos Republicanos obstruir a aprovação de suas propostas. Além disso, ainda não há clareza sobre os efeitos da crise principalmente nos bancos.

"Acho que Wall Street ainda está na esperança de uma saída fácil e não haverá saída fácil", disse o presidente Obama, em entrevista à rede de TV ABC News. Afirmou que a estatização ou nacionalização dos bancos não resolveria o problema, como foi sugerido, pois há milhares deles nos EUA e não apenas quatro ou cinco como na Suécia ou outros países europeus. "Estamos sendo excepcionalmente cuidadosos para que o contribuinte seja protegido, para que tomemos riscos que compreendamos e que usemos esses recursos de uma maneira que dê o máximo de benefício ao fazer com que esses mercados funcionem novamente", disse, por sua vez, o Secretário Geithner, segundo o Wall Street Journal.

Enfim, não cabem imediatismos na análise dos méritos da atuação do governo Obama. Os EUA não são um país de medidas provisórias. Nem o endeusado Franklin Delano Roosevelt escapou de ferozes oposição e críticas com o seu New Deal e os EUA só voltaram a crescer bastante em função da II Guerra Mundial, quando virou o fornecedor do mundo. Obama está se mexendo na direção necessária. Como diz o editorial desta quarta-feira do Valor Econômico: "Consertar a atual crise leva tempo, mas quase todos os meios fundamentais para isso estão em campo - falta ajustá-los. Com tanto dinheiro despejado nos mercados, é difícil que não dê certo"

4 comentários:

  1. Oi, Serrano, virei freguês do seu blog. Abração!
    Zé Lúcio

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  2. Serrano, subscrevo seus comentários. Para não alongar muito a nota, meu pai, que foi do BC, dizia: para ganhar dinheiro, banqueiro é capaz de tudo, até de uma boa ação... Walter Camargo

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  3. Serrano,
    vou indicar seu blog por aí. Seus comentários são ótimos! Abs Isa

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  4. Caro Serrano, a sua análise foi na medida certa. Realmente é de espantar a pressa da mídia, em geral, em tirar conclusões e - de certa forma - esperar um remédio milagroso. O que mais me chamou a atenção, no noticiário de ontem, especialmente no Brasil, foi o fato de se destacar que o plano foi mal recebido por Wall Street - uma obviedade em si mesma, já que o programa visa, em especial, complicar a vida dos bancos e financeiras que até aqui deitavam e rolavam. Sem contar uma certa ciumeira: desta vez o governo não fêz consultas prévias a Wall Street, para elaborar um pacote. Abração. Meirelles
    (jmeirelles@oglobo.com.br)

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