Já que eu estava acabando de reler o clássico sobre a Revolução Francesa de Georges Lefebvre, Maria Helena se adiantou na leitura da elogiada biografia de Carlos Castelo Branco, escrita por Carlos Marchi. Assim, depois de confirmar, mais uma vez, que uma revolução é um processo complexo e tortuoso, que abala todas as instituições de um país, no caso, de um continente, dediquei-me à biografia de outro jornalista que fez história, Herbert L. Matthews, do New York Times. O nome do livro é O homem que inventou Fidel. O autor, outro correspondente e repórter do New York Times por 20 anos, é Anthony DePalma
Matthews, veterano correspondente na invasão da Abissínia pela Itália, na guerra civil da Espanha e na II Guerra Mundial, foi o primeiro jornalista a entrevistar Fidel na Sierra Maestra, ainda em 1957, quando o regime ditatorial de Fulgencio Batista estimulava a informação de que ele havia morrido no desembarque de seu grupo na costa cubana, vindo do México a bordo do iate Granma.
A entrevista foi publicada na primeira página do New York Times, com a descrição de que Fidel era um democrata que queria livrar Cuba de uma ditadura cruel e granjeou simpatias para o líder cubano e seu Movimento 26 de julho. A partir desse momento, Mathews, que tinha a privilegiada posição de correspondente e editorialista do jornal, se envolveu com o destino da revolução cubana até morrer em 1977. Nessa trajetória, da glória do primeiro momento caminhou para a execração nos EUA à medida em que Fidel Castro se aproximou da União Soviética e declarou que o regime cubano era comunista.
Matthews defendeu a vida toda a sua tese de que Fidel não era comunista no começo de sua revolução e só se aproximou do comunismo à medida. que os EUA foram endurecendo o tratamento com ele. Dizia que os governos americanos nunca compreenderam o líder cubano.
A história de Matthews ganha novo interesse neste momento em que Barack Obama lança novas bases para o relacionamento dos EUA com Cuba, partindo do princípio que 50 anos de bloqueio econômico não levaram a nada - e só criam ruídos nas relações com uma América Latina cada vez mais crítica aos EUA. E também pelo fato inexorável de que a passagem do tempo aproxima do fim o comando dos irmãos Castro sobre o país.
O livro revela as relações entre os acionistas e jornalistas de diversas hierarquias dentro de um jornal liberal como o New York Times naquela época, que já haviam sido descortinadas por Gay Talese em seu The Kingdom and Power, nos anos 70. Depois que cresceram as críticas às simpatias de Matthews por Fidel, ele viveu permanentemente às turras com seus colegas de jornal, especialmente quando suas matérias não eram publicadas. Demitiu-se, por iniciativa própria, em 1967, apesar de ter recebido apelos para não fazê-lo.
A imprensa de hoje não é a mesma daqueles tempos, seja nos EUA, no Brasil, no mundo. Mas o livro traz à luz um relato muito interessante sobre o relacionamento entre poder, governos, imprensa e jornalistas e suas consequências sobre a opinião pública - que continua relevante, mesmo nestes tempos de ampliação da influências das redes sociais tão saudada pelos críticos da imprensa.
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